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Problemas decorrentes das Cessões de Uso

Escrito em: 21/05/2021

Uma Secretaria de Estado da Segurança Pública, durante um longo período de tempo, tem cedido alguns bens do seu acervo patrimonial para outros órgãos ligados à mesma. 

Recentemente, a sua área de patrimônio foi surpreendida com um pedido de um desses órgãos, solicitando o conserto de um bem, por ser de propriedade da referida  Secretaria,  uma vez que eles não poderiam providenciar o reparo, por se tratar de bens de terceiros.

 

Diante do ocorrido e por ter a Secretaria uma margem muito pequena no seu orçamento para essa rubrica, o conserto não foi aprovado. O questionamento que nos foi feito foi: Qual a providência que deveria ser tomada para que o órgão fizesse o conserto? 

 

Antes de apresentar a resposta e a sugestão dada para esse caso, é importante relembrarmos os procedimentos referentes às cessões. 

 

A cessão não é considerada uma forma de alienação, porque o direito de propriedade do bem continua sendo da Instituição que a promoveu, ou seja, do cedente. 

 

A palavra cessão apresenta diversos significados, como: ato ou efeito de ceder, cedência, cedimento, transferência de posse ou direito, desistência, renúncia, concessão de vantagem ou procedência a..., outorga, empréstimo. 

 

Em termos de legislação vamos encontrar:

 

- O Decreto nº 99.658, de 30 de outubro de 1990, embora revogado com a publicação do Decreto nº 9.373/18, apresentava no seu inciso III do artigo 3º a seguinte definição: “Cessão: modalidade de movimentação de material do acervo, com transferência gratuita de posse e troca de responsabilidade, entre órgãos ou entidades da Administração Pública Federal Direta, Autárquica e Fundacional do Poder Executivo ou entre estes e outros, integrantes de qualquer dos demais Poderes da União”.

 

- O texto do novo Decreto sobre as cessões assim se apresenta: 

 

Art. 4º “A cessão, modalidade de movimentação de bens de caráter precário e por prazo determinado, com transferência de posse, poderá ser realizada nas seguintes hipóteses:

 

I – entre órgãos da União;

II - entre a União e as autarquias e fundações públicas federais; ou

III - entre a União e as autarquias e fundações públicas federais e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e suas autarquias e fundações.

Parágrafo único. A cessão dos bens não considerados inservíveis será admitida, excepcionalmente, mediante justificativa da autoridade competente”.

 

- na Instrução Normativa nº 205, de 8 de abril de 1988, vamos encontrar a citação da cessão como sendo: “11. A cessão consiste na movimentação de material do acervo, com transferência de posse, gratuita, com troca de responsabilidade, de um órgão para outro, dentro do âmbito da Administração Federal Direta”.

 

Obs.: Esse dispositivo também se aplica nos casos de não existir legislação específica nos níveis Estadual e Municipal.

 

Um detalhe importante que constava do Parágrafo 1º do Art. 4º, do antigo Decreto (Decreto nº 99.658/90) era a documentação pertinente: “A cessão será efetivada mediante Termo de Cessão, do qual constarão a indicação de transferência de carga patrimonial, da unidade cedente para a cessionária, e o valor da aquisição ou custo de produção”.

 

Embora nas legislações atuais essa necessidade não esteja explicitada, é claro que precisaremos documentar esse tipo de transação.

 

Outro ponto a ser considerado é que nas citadas Legislações não aparecem as Sociedades de Economia Mista, nem as Empresas Públicas, embora estas também façam parte da Administração Pública Indireta.

 

Ocorre que ambas, por explorarem atividades econômicas, seguirem a contabilidade comercial e não a pública, não fazem cessão e sim comodato.

 

O que difere ambos os conceitos é que o primeiro, como já foi dito, é realizado por uma Instituição Pública (Administração Direta, Autarquias e Fundações) e o segundo, por uma Instituição Privada ou órgão da Administração Pública Indireta, desde que seja Sociedade de Economia Mista ou Empresa Pública.

 

No caso da cessão. como já foi visto anteriormente, é emitido um “termo de cessão” entre o cedente (aquele que cede o bem) e o cessionário (aquele que recebe o bem). No caso do comodato, existe um contrato firmado entre as partes.

 

Em ambos os casos existem cláusulas a serem cumpridas, como: vigência do contrato, prazo para a devolução, impostos e taxas a serem pagos, manutenção, seguros, etc.

 

É importante observar que tanto em uma como em outra modalidade, o cessionário tem a posse do bem, faz uso dele, mas não tem a sua propriedade, devendo sempre dar o tratamento de “bens de terceiros”.

 

Segue um modelo básico referente a uma Cessão de Uso por tempo determinado, podendo ser adaptado às mais diversas situações:

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Como foi citada a figura do Comodato, aproveitamos o ensejo para apresentar a sua definição de acordo com o Novo Código Civil:

 

“Art. 579. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto. ”(tradição, neste caso, significa entrega). É realizado pelas Sociedades de Economia Mista, pelas Empresas Públicas e pelas Entidades Privadas, sendo o comodatário qualquer tipo de Instituição, seja ela Pública ou Privada, através de contrato, com cláusulas de obrigações bem definidas.

 

Com relação a coisas fungíveis e não fungíveis, é importante relembrar:

 

- “Coisas fungíveis” são aquelas que podem ser substituídas por outras. Embora possuam características semelhantes, não são absolutamente idênticas, e aquelas que a substituírem deverão desempenhar funções parecidas ou de natureza similar.

 

- “Coisas não fungíveis ou infungíveis” são aquelas insubstituíveis na sua forma. Portanto, só poderão ser substituídas por outras exatamente iguais.

 

Voltando à problemática das cessões, vamos encontrar uma grande proporção das mesmas em que as cláusulas previstas nos termos, não são cumpridas por parte dos cessionários.

 

Às vezes, impostos sobre veículos não são pagos, acumulando dívidas e deixando os mesmos irregulares, mas ainda transitando normalmente por meio dos cessionários, gerando até multas contra a Instituição proprietária. Manutenções precárias ou não realizadas, não só em veículos, mas também em equipamentos, gerando seu desgaste prematuro e muitas vezes permanecendo nas dependências do cessionário sem utilização, também ocorrem, mas continuam fazendo parte dos ativos do cedente, como se estivessem em uso.

 

Temos observado que atualmente muitas Instituições, devido a problemas desse tipo, preferem ao invés de fazer cessões, realizar doações, desde que as legislações vigentes permitam e que os órgãos interessados em recebê-las se enquadrem também nos dispositivos legais.

 

Finalmente, voltando a resposta que demos àquela Secretaria, vamos transcrevê-la a seguir: “Como se trata de uma Cessão de Uso, deve ter sido lavrado um termo na ocasião do repasse do bem ao outro órgão. Nesse tipo de documento devem constar diversas cláusulas, dentre as quais uma, referente à manutenção ou conserto dos bens por parte do cessionário, enquanto estes estiverem em seu poder. Sugiro que verifiquem a existência dessa cláusula, pois se ela existir esse órgão terá a obrigação de consertá-lo”.

 

Completei dizendo que: “Infelizmente, se não houver nada escrito, talvez vocês tenham que negociar com o outro órgão, alegando a sua indisponibilidade de recursos para essa finalidade e como eles adquiriram o “direito de uso” do bem e paralelamente algumas obrigações, deverão arcar com essa despesa”.

 

No entanto, a decisão da Secretaria foi outra: “Como o bem está apresentando problemas e não há nenhum item que fale sobre consertos estamos solicitando à Cessionária a devolução do mesmo”.

 

Complementei dizendo que: “Também é uma boa medida. Talvez a sua Comissão de Alienação de Materiais/Bens venha atestar a inservibilidade do mesmo, não sendo nesse caso, necessária a sua recuperação. Dependendo dessa nova classificação (ocioso, recuperável, antieconômico/obsoleto ou irrecuperável, de acordo com o Art. 3º do Decreto nº 9.373/18), o mesmo poderá ser alienado”.

 

Por isso que o controle dos “bens em poder de terceiros” por parte dos responsáveis pela gestão patrimonial é de suma importância, inclusive, sempre que possível, devem inventariá-los.

 

O oposto também é verdadeiro pois, poderemos ter na nossa planta “bens de propriedade de terceiros”, cujo controle por parte do patrimônio também se torna necessário.

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